sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

Dever de proteção estadual dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos



"Cum igitur hominum causa omne ius constitutum sit, primo de personarum statu ac post de ceteris, ordinem edicti perpetui secuti et his proximos atque coniunctos applicantes titulos ut res patitur, dicemus". - Hermog. D. 1, 5, 2
"Como, portanto, todo o Direito é constituído por causa do homem, nós declaramos ter seguido a ordem do édito perpétuo, tratando primeiramente do status das pessoas e depois das coisas, aplicando porém os títulos semelhantes e conexos, conforme comporte a matéria". - Hermog. D. 1, 5, 2

De facto, como vem referido no Digesto, o Direito é criado por causa dos homens e, em particular, a fim de responder à sua necessidade de Justiça. E assim sendo, o estudo do Direito só pode dar primazia ao status das pessoas.
Aliás, o seguimento dessa ordem sistemática baseia-se no édito perpétuo que corresponde a uma recompilação de éditos dos pretores que, sendo juristas (romanos), criavam parte da legislação romana. Tais éditos encontravam-se sistematizados por títulos e conectados entre si segundo as matérias a que diziam respeito.
E, esta sistematização do Direito constitui, porventura, a génese do estudo dos direitos fundamentais alicerçados na eminente dignidade da pessoa humana e na igualdade do género humano.
Pois, se a dignidade e a igualdade humana transcendem qualquer figuração da razão, por serem inerentes à autonomia ética do Homem, certo é que o pensamento humano sobre esta realidade e a sua formulação teve a sua origem apenas nos estóicos - séc. III a. C. - e foi desenvolvida durante os séculos seguintes até à actualidade.
Assim, a Constituição da República Portuguesa proclama no primeiro artigo que "Portugal é uma República soberana baseada na dignidade da pessoa humana...". No artigo 12.º, n.º 1, a mesma constituição proclama que todos os cidadãos gozam dos direitos e estão sujeitos aos deveres aí consignados. E o artigo seguinte da lei fundamental reconhece que "todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei", afirmando que "ninguém pode ser privelegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou ourientação sexual".
Ora, estes preceitos constitucionais têm efeitos não somente verticais (isto é, vinculam os Estado e os cidadãos nas suas relações recíprocas), mas também têm efeitos horizontais mediatos (ou seja, vinculam os particulares).
Todavia, quer nas relações entre o Estado e os cidadãos, quer nas relações entre privados, deve existir um dever de protecção estadual dos direitos fundamentais. Esse mesmo dever de protecção implica, para o Estado, não somente o dever de respeitar esses mesmos direitos fundamentais e o dever de criar as condições necessárias para a sua realização, mas ainda o dever de os proteger contra quaisquer ameaças, incluindo as que resultem da actuação de outros particulares.


Pelo que, ao legislador, incumbe fazer as leis reguladoras das relações jurídicas públicas e privadas, prevenindo, proibindo e reprimindo quaisquer agressões aos direitos fundamentais que possam ocorrer e prevendo os respectivos meios de ressarcimento e, ao juiz, cumpre resolver os correlativos conflitos jurídicos, sempre de acordo com os princípios fundamentais da legalidade, da igualdade e da proporcionalidade.

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