sexta-feira, 11 de setembro de 2009

O regime jurídico do apadrinhamento civil

A Lei n.º 103/2009, de 11 de Setembro, cria uma nova relação jurídica, que será tendencialmente de carácter permanente - constituída por homologação ou decisão judicial e sujeita a registo - entre uma criança ou jovem menor de 18 anos, desde que não se verifiquem os pressupostos da confiança com vista à adopção, e uma pessoa singular ou uma família que exerça os poderes e deveres próprios dos pais e que com ele estabeleçam vínculos afectivos que permitam o seu bem-estar e desenvolvimento.
Todavia, na medida em que a referida lei tem como finalidade a necessária desinstitucionalização, a nível nacional, das crianças e jovens, o mesmo diploma legal só se aplica obviamente às crianças que residam em território nacional.
Esta figura jurídica - já há tempos existente no ordenamento jurídico brasileiro - tem subjacente o facto de que o processo de desenvolvimento pessoal infanto-juvenil, nas suas vertentes física, psicológica, moral, social e intelectiva, carece de uma convivência de natureza familiar de total proximidade. Faltando essa convivência, é essencial criar uma relação pessoal que a substitua e criar o suporte jurídico que a fundamente.
Assim, e para o efeito, o nosso ordenamento jurídico prevê três institutos jurídicos: a tutela, o apadrinhamento civil e a adopção plena ou restrita. Sendo que, o apadrinhamento civil permite, nos casos em que a adopção não seja possível, representar juridicamente e de forma expressa a existência imprescindível de laços afectivos entre o (s) padrinho (s) e a criança que lhe(s) é confiada. Pois, na realidade, pretende-se que a figura da tutela tenda a ser uma figura jurídica de cariz subsidiário.
Mas, para além do facto de representar juridicamente uma realidade afectiva, o apadrinhamento civil consubstancia-se ainda num verdadeiro compromisso - civil ou judicial - do (s) padrinho (s) de acompanhar, orientar, assistir e apoiar a educação, o desenvolvimento e o projecto de vida da criança ou adolescente que, para o efeito, lhe é entregue, porquanto os padrinhos exercem todas as responsabilidades parentais, ressalvadas as limitações aí previstas.
De facto, atendendo a que a infância tem direito a uma atenção e assistência especiais, devido à sua vulnerabilidade, e atendendo a que a família é o núcleo social natural - mesmo que não biológico - mais favorável para o integral desenvolvimento das crianças, pretende-se reconhecer expressamente e efectivar esse mesmo direito fundamental, dando cumprimento à Declaração Universal dos Direitos da Criança bem como à Constituição da República - artigos 67.º e seguintes.
E, desde logo, encontra-se plasmado na lei do apadrinhamento civil o direito ao reconhecimento do superior interesse da criança. Aliás, a criação do diploma legal consiste, precisamente, nesse mesmo reconhecimento, na medida em que e, antes de mais, é do superior interesse da criança que a mesma seja acolhida num seio familiar onde possa crescer de acordo com um projecto de vida adequado à sua personalidade. Mas, não se descora de todo a ligação parental, na medida em que os pais continuarão a acompanhar o desenvolvimento dos seus filhos - salvo se os mesmos tiverem infringido culposamente os seus deveres para com os filhos, com grave prejuízo destes - designadamente, os pais beneficiam dos direitos de conhecer a identidade dos padrinhos e de dispor de uma forma de contactar quer os seus filhos quer os padrinhos destes, ser informados de todos os aspectos relevantes do desenvolvimento dos seus filhos e visitar os seus filhos, sempre que o exercício desses direitos não ponham em risco a segurança ou a saúde física ou psíquica da criança ou do jovem ou não comprometam o êxito da relação de apadrinhamento civil.

E, finalmente protege-se a relação entre padrinhos e o afilhado, na medida em que estes têm direito, designadamente, a beneficiar do regime jurídico de faltas e licenças equiparado ao dos pais e dos filhos, a beneficiar de prestações sociais nos mesmos termos dos pais e dos filhos, a acompanhar-se reciprocamente na assistência na doença, como se fossem pais e filhos. E, até em matéria fiscal, a lei prevê que os padrinhos tenham direito a considerar o afilhado como dependente para efeitos do disposto nos artigos 79.º, 82.º e 83.º do Código do IRS.
Resta-nos esperar que as crianças possam, assim, encontrar nos seus padrinhos o aconchego material e afectivo que os seus pais não estejam em condições de lhes dar, pois essa é finalidade da Lei n.º 103/2009, de 11 de Setembro:

A Assembleia da República decreta, nos termos da alínea c) do artigo 161.º da Constituição, o seguinte:
Artigo 1.º
Objecto
A presente lei estabelece o regime jurídico aplicável ao apadrinhamento civil.
Artigo 2.º
Definição
O apadrinhamento civil é uma relação jurídica, tendencialmente de carácter permanente, entre uma criança ou jovem e uma pessoa singular ou uma família que exerça os poderes e deveres próprios dos pais e que com ele estabeleçam vínculos afectivos que permitam o seu bem-estar e desenvolvimento, constituída por homologação ou decisão judicial e sujeita a registo civil.
Artigo 3.º
Âmbito
A presente lei aplica-se às crianças e jovens que residam em território nacional.
Artigo 4.º
Capacidade para apadrinhar
Podem apadrinhar pessoas maiores de 25 anos, previamente habilitadas para o efeito, sem prejuízo do disposto no n.º 5 do artigo 11.º
Artigo 5.º
Capacidade para ser apadrinhado
1 - Desde que o apadrinhamento civil apresente reais vantagens para a criança ou o jovem e desde que não se verifiquem os pressupostos da confiança com vista à adopção, a apreciar pela entidade competente para a constituição do apadrinhamento civil, pode ser apadrinhada qualquer criança ou jovem menor de 18 anos:
a) Que esteja a beneficiar de uma medida de acolhimento em instituição;
b) Que esteja a beneficiar de outra medida de promoção e protecção;
c) Que se encontre numa situação de perigo confirmada em processo de uma comissão de protecção de crianças e jovens ou em processo judicial;
d) Que, para além dos casos previstos nas alíneas anteriores, seja encaminhada para o apadrinhamento civil por iniciativa das pessoas ou das entidades referidas no artigo 10.º
2 - Também pode ser apadrinhada qualquer criança ou jovem menor de 18 anos que esteja a beneficiar de confiança administrativa, confiança judicial ou medida de promoção e protecção de confiança a instituição com vista a futura adopção ou a pessoa seleccionada para a adopção quando, depois de uma reapreciação fundamentada do caso, se mostre que a adopção é inviável.
Artigo 6.º
Proibição de vários apadrinhamentos civis
Enquanto subsistir um apadrinhamento civil não pode constituir-se outro quanto ao mesmo afilhado, excepto se os padrinhos viverem em família.
Artigo 7.º
Exercício das responsabilidades parentais dos padrinhos
1 - Os padrinhos exercem as responsabilidades parentais, ressalvadas as limitações previstas no compromisso de apadrinhamento civil ou na decisão judicial.
2 - São aplicáveis, com as necessárias adaptações, os artigos 1936.º a 1941.º do Código Civil.
3 - Se os pais da criança ou do jovem tiverem falecido, se estiverem inibidos do exercício das responsabilidades parentais ou se forem incógnitos, são ainda aplicáveis, com as devidas adaptações, os artigos 1943.º e 1944.º do mesmo Código.
4 - As obrigações estabelecidas nos artigos referidos no número anterior são cumpridas perante as entidades que constituem o vínculo de apadrinhamento civil.
5 - É aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 2.º a 4.º do Decreto-Lei n.º 272/2001 , de 13 de Outubro.
Artigo 8.º
Direitos dos pais
1 - Os pais, exceptuados os casos previstos no n.º 3 do artigo 14.º, beneficiam dos direitos expressamente consignados no compromisso de apadrinhamento civil, designadamente:
a) Conhecer a identidade dos padrinhos;
b) Dispor de uma forma de contactar os padrinhos;
c) Saber o local de residência do filho;
d) Dispor de uma forma de contactar o filho;
e) Ser informados sobre o desenvolvimento integral do filho, a sua progressão escolar ou profissional, a ocorrência de factos particularmente relevantes ou de problemas graves, nomeadamente de saúde;
f) Receber com regularidade fotografias ou outro registo de imagem do filho;
g) Visitar o filho, nas condições fixadas no compromisso ou na decisão judicial, designadamente por ocasião de datas especialmente significativas.
2 - O tribunal pode estabelecer limitações aos direitos enunciados nas alíneas d) e g) do número anterior quando os pais, no exercício destes direitos, ponham em risco a segurança ou a saúde física ou psíquica da criança ou do jovem ou comprometam o êxito da relação de apadrinhamento civil.
3 - Os direitos previstos no n.º 1 podem ser reconhecidos relativamente a outras pessoas, nos termos que vierem a ser estabelecidos no compromisso de apadrinhamento civil ou na decisão judicial, sendo neste caso aplicáveis os princípios referidos no artigo 9.º
Artigo 9.º
Princípios orientadores das relações entre pais e padrinhos
1 - Os pais e padrinhos têm um dever mútuo de respeito e de preservação da intimidade da vida privada e familiar, do bom nome e da reputação.
2 - Os pais e padrinhos devem cooperar na criação das condições adequadas ao bem-estar e desenvolvimento do afilhado.
Artigo 10.º
Legitimidade para tomar a iniciativa
1 - O apadrinhamento civil pode ser da iniciativa:
a) Do Ministério Público;
b) Da comissão de protecção de crianças e jovens, no âmbito dos processos que aí corram termos;
c) Do organismo competente da segurança social ou de instituição por esta habilitada nos termos do n.º 3 do artigo 12.º;
d) Dos pais, representante legal da criança ou do jovem ou pessoa que tenha a sua guarda de facto;
e) Da criança ou do jovem maior de 12 anos.
2 - Quando a iniciativa for da criança ou do jovem maior de 12 anos, o tribunal ou o Ministério Público, conforme o caso, nomeia, a seu pedido, patrono que o represente.
3 - O apadrinhamento civil pode também ser constituído oficiosamente pelo tribunal.
Artigo 11.º
Designação dos padrinhos
1 - Tomada a iniciativa do apadrinhamento civil por quem tiver legitimidade, os padrinhos são designados de entre pessoas ou famílias habilitadas, constantes de uma lista regional do organismo competente da segurança social.
2 - Quando o apadrinhamento civil tiver lugar por iniciativa dos pais, do representante legal da criança ou do jovem, ou da pessoa que tenha a sua guarda de facto, ou ainda da criança ou do jovem, estes podem designar a pessoa ou a família da sua escolha para padrinhos, mas a designação só se torna efectiva após a respectiva habilitação.
3 - Quando a designação prevista no número anterior não tiver sido feita, ou não se tiver tornado efectiva, os padrinhos são escolhidos nos termos do n.º 1.
4 - A instituição que tiver acolhido a criança ou o jovem pode designar os padrinhos, nos termos do n.º 1.
5 - Podem ser designados como padrinhos os familiares, a pessoa idónea ou a família de acolhimento a quem a criança ou o jovem tenha sido confiado no processo de promoção e protecção ou o tutor.
6 - A escolha dos padrinhos é feita no respeito pelo princípio da audição obrigatória e da participação no processo da criança ou do jovem e dos pais, representante legal ou pessoa que tenha a sua guarda de facto.
Artigo 12.º
Habilitação dos padrinhos
1 - A habilitação consiste na certificação de que a pessoa singular ou os membros da família que pretendem apadrinhar uma criança ou jovem possuem idoneidade e autonomia de vida que lhes permitam assumir as responsabilidades próprias do vínculo de apadrinhamento civil.
2 - A habilitação dos padrinhos cabe ao organismo competente da segurança social.
3 - Mediante acordos de cooperação celebrados com o organismo competente da segurança social, as instituições que disponham de meios adequados podem adquirir a legitimidade para designar e habilitar padrinhos.
4 - À recusa de habilitação dos padrinhos é aplicável o disposto no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 185/93 , de 22 de Maio, alterado pelo Decreto-Lei n.º 120/98 , de 8 de Maio, e pelas Leis n.os 31/2003, de 22 de Agosto, e 28/2007, de 2 de Agosto.
Artigo 13.º
Constituição da relação de apadrinhamento civil
1 - O apadrinhamento civil constitui-se:
a) Por decisão do tribunal, nos casos em que esteja a correr um processo judicial de promoção e protecção ou um processo tutelar cível, nos casos em que, não sendo obtido o consentimento de uma das pessoas referidas no n.º 1 do artigo 14.º, possa o mesmo ser dispensado nos termos do n.º 4 do mesmo artigo, e nos casos em que tenha havido parecer desfavorável do conselho de família;
b) Por compromisso de apadrinhamento civil homologado pelo tribunal.
2 - O tribunal deve, sempre que possível, tomar em conta um compromisso de apadrinhamento civil que lhe seja proposto ou promover a sua celebração, com a observância do n.º 6 do artigo 11.º
3 - O apadrinhamento civil pode constituir-se em qualquer altura de um processo de promoção e protecção ou de um processo tutelar cível e, quando tiver lugar após a aplicação de uma medida de promoção e protecção ou após uma decisão judicial sobre responsabilidades parentais com que se mostre incompatível, determina necessariamente a sua cessação.
Artigo 14.º
Consentimento para o apadrinhamento civil
1 - Para o apadrinhamento civil é necessário o consentimento:
a) Da criança ou do jovem maior de 12 anos;
b) Do cônjuge do padrinho ou da madrinha não separado judicialmente de pessoas e bens ou de facto ou da pessoa que viva com o padrinho ou a madrinha em união de facto;
c) Dos pais do afilhado, mesmo que não exerçam as responsabilidades parentais, e ainda que sejam menores;
d) Do representante legal do afilhado;
e) De quem tiver a sua guarda de facto, nos termos do artigo 5.º da Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo.
2 - O consentimento das pessoas referidas nas alíneas c), d) e e) do número anterior não é necessário quando, tendo havido confiança judicial ou tendo sido aplicada medida de promoção e protecção de confiança a instituição com vista a futura adopção ou a pessoa seleccionada para adopção, se verifique a situação prevista no n.º 2 do artigo 5.º
3 - Não é necessário o consentimento dos pais que tenham sido inibidos das responsabilidades parentais por terem infringido culposamente os deveres para com os filhos, com grave prejuízo destes.
4 - O tribunal pode dispensar o consentimento:
a) Das pessoas que o deveriam prestar nos termos do n.º 1, se estiverem privadas do uso das faculdades mentais ou se, por qualquer outra razão, houver grave dificuldade em as ouvir;
b) Das pessoas referidas nas alíneas c), d) e e) do n.º 1, quando se verifique alguma das situações que, nos termos das alíneas c), d) e e) do n.º 1 do artigo 1978.º do Código Civil, permitiriam a confiança judicial;
c) Do representante legal ou de quem tenha a guarda de facto quando estes ponham em perigo a segurança, saúde, formação, educação ou desenvolvimento da criança ou do jovem;
d) Dos pais da criança ou do jovem, quando tenham sido inibidos totalmente do exercício das responsabilidades parentais fora dos casos previstos no número anterior;
e) Dos pais da criança ou do jovem, quando, tendo sido aplicada qualquer medida de promoção e protecção, a criança ou o jovem não possa regressar para junto deles ou aí permanecer por persistirem factores de perigo que imponham o afastamento, passados 18 meses após o início da execução da medida.
5 - As comissões de protecção de crianças e jovens, a segurança social e as instituições por esta habilitadas nos termos do n.º 3 do artigo 12.º comunicam ao tribunal os casos em que entendam dever haver lugar a dispensa do consentimento, cabendo a este desencadear o procedimento previsto no n.º 5 do artigo 19.º
6 - Quando a criança ou o jovem estiver sujeito a tutela, exige-se o parecer favorável do conselho de família.
Artigo 15.º
Comunicação
Nos casos em que a comissão de protecção de crianças e jovens ou o organismo competente da segurança social, ou a instituição por esta habilitada, entenderem que a iniciativa do apadrinhamento civil que lhes foi apresentada pelos pais, pelo representante legal da criança ou do jovem, pela pessoa que tenha a sua guarda de facto, ou pela criança ou jovem maior de 12 anos, não se revela capaz de satisfazer o interesse da criança ou do jovem, comunicam-no ao tribunal, com o seu parecer.
Artigo 16.º
Compromisso de apadrinhamento civil
O compromisso de apadrinhamento civil, ou a decisão do tribunal, contém obrigatoriamente:
a) A identificação da criança ou do jovem;
b) A identificação dos pais, representante legal ou pessoa que tenha a sua guarda de facto;
c) A identificação dos padrinhos;
d) As eventuais limitações ao exercício, pelos padrinhos, das responsabilidades parentais;
e) O regime das visitas dos pais ou de outras pessoas, familiares ou não, cujo contacto com a criança ou jovem deva ser preservado;
f) O montante dos alimentos devidos pelos pais, se for o caso;
g) As informações a prestar pelos padrinhos ou pelos pais, representante legal ou pessoa que tinha a sua guarda de facto, à entidade encarregada do apoio do vínculo de apadrinhamento civil.
Artigo 17.º
Subscritores do compromisso
Subscrevem obrigatoriamente o compromisso:
a) Os padrinhos;
b) As pessoas que têm de dar consentimento;
c) A instituição onde a criança ou o jovem estava acolhido e que promoveu o apadrinhamento civil;
d) A entidade encarregada de apoiar o apadrinhamento civil;
e) O pró-tutor, quando o tutor vier a assumir a condição de padrinho.
Artigo 18.º
Competência
É competente para a constituição do apadrinhamento civil, nos termos do n.º 1 do artigo 13.º, o tribunal de família e menores ou, fora das áreas abrangidas pela jurisdição dos tribunais de família e menores, o tribunal da comarca da área da localização da instituição em que a criança ou o jovem se encontra acolhido ou da área da sua residência.
Artigo 19.º
Processo
1 - Quando o compromisso de apadrinhamento civil for celebrado na comissão de protecção de crianças e jovens ou no organismo competente da segurança social, ou em instituição por esta habilitada, é o mesmo enviado ao tribunal competente, para homologação, acompanhado de relatório social.
2 - Caso o tribunal considere que o compromisso não acautela suficientemente os interesses da criança ou do jovem, ou não satisfaz os requisitos legais, pode convidar os subscritores a alterá-lo, após o que decide sobre a homologação.
3 - As pessoas referidas no artigo 10.º da presente lei dirigem a sua pretensão à comissão de protecção de crianças e jovens, ou ao tribunal, em que já corra termos processo respeitante à mesma criança ou jovem ou, na sua inexistência, ao Ministério Público, ao organismo competente da segurança social ou a instituição por esta habilitada nos termos do n.º 3 do artigo 12.º
4 - No prazo de 10 dias após a sua notificação, a criança ou o jovem, os seus pais, representante legal, a pessoa que tenha a guarda de facto e os padrinhos podem requerer a apreciação judicial:
a) Da decisão de não homologação do compromisso de apadrinhamento civil pelo Ministério Público;
b) Do despacho de confirmação, pelo Ministério Público, do parecer negativo à constituição do apadrinhamento civil, previsto no artigo 15.º, seguindo o processo os seus termos como processo judicial quando o juiz dele discordar.
5 - Nos casos em que pode haver lugar a dispensa do consentimento, nos termos do n.º 4 do artigo 14.º, o tribunal notifica o Ministério Público, a criança ou o jovem maior de 12 anos, os pais, o representante legal ou quem detiver a guarda de facto para alegarem por escrito, querendo, e apresentarem prova no prazo de 10 dias.
6 - Se não for apresentada prova, a decisão é da competência do juiz singular, se for apresentada prova, há lugar a debate judicial perante um tribunal composto pelo juiz, que preside, e por dois juízes sociais.
7 - O processo judicial de apadrinhamento civil é de jurisdição voluntária.
8 - O processo judicial de apadrinhamento civil é tramitado por via electrónica nos termos gerais das normas de processo civil.
9 - Em qualquer estado da causa e sempre que o entenda conveniente, oficiosamente, com o consentimento dos interessados, ou a requerimento destes, pode o juiz determinar a intervenção de serviços públicos ou privados de mediação.
Artigo 20.º
Apoio ao apadrinhamento civil
1 - O apoio do apadrinhamento civil tem em vista:
a) Criar ou intensificar as condições necessárias para o êxito da relação de apadrinhamento;
b) Avaliar o êxito da relação de apadrinhamento, do ponto de vista do interesse do afilhado.
2 - O apoio cabe às comissões de protecção de crianças e jovens, nos casos em que o compromisso de apadrinhamento civil foi celebrado em processo que aí correu termos, ou ao organismo competente da segurança social.
3 - O organismo competente da segurança social pode delegar o apoio em instituições que disponham de meios adequados.
4 - O apoio termina quando a entidade responsável concluir que a integração familiar normal do afilhado se verificou e, em qualquer caso, passados 18 meses sobre a constituição do vínculo.
Artigo 21.º
Alimentos
1 - Os padrinhos consideram-se ascendentes em 1.º grau do afilhado para efeitos da obrigação de lhe prestar alimentos, mas são precedidos pelos pais deste em condições de satisfazer esse encargo.
2 - O afilhado considera-se descendente em 1.º grau dos padrinhos para o efeito da obrigação de lhes prestar alimentos, mas é precedido pelos filhos destes em condições de satisfazer este encargo.
Artigo 22.º
Impedimento matrimonial e dispensa
1 - O vínculo de apadrinhamento civil é impedimento impediente à celebração do casamento entre padrinhos e afilhados.
2 - O impedimento é susceptível de dispensa pelo conservador do registo civil, que a concede quando haja motivos sérios que justifiquem a celebração do casamento, ouvindo, sempre que possível, quando um dos nubentes for menor, os pais.
3 - A infracção do disposto no n.º 1 do presente artigo importa, para o padrinho ou madrinha, a incapacidade para receber do seu consorte qualquer benefício por doação ou testamento.
Artigo 23.º
Direitos
1 - Os padrinhos e o afilhado têm direito a:
a) Beneficiar do regime jurídico de faltas e licenças equiparado ao dos pais e dos filhos;
b) Beneficiar de prestações sociais nos mesmos termos dos pais e dos filhos;
c) Acompanhar-se reciprocamente na assistência na doença, como se fossem pais e filhos.
2 - Os padrinhos têm direito a:
a) Considerar o afilhado como dependente para efeitos do disposto nos artigos 79.º, 82.º e 83.º do Código do IRS;
b) Beneficiar do estatuto de dador de sangue.
3 - O afilhado beneficia das prestações de protecção nos encargos familiares e integra, para o efeito, o agregado familiar dos padrinhos.
Artigo 24.º
Duração
1 - O apadrinhamento civil constitui um vínculo permanente, salvo o disposto no artigo seguinte.
2 - Os direitos e obrigações dos padrinhos inerentes ao exercício das responsabilidades parentais e os alimentos cessam nos mesmos termos em que cessam os dos pais, ressalvadas as disposições em contrário estabelecidas no compromisso de apadrinhamento civil.
Artigo 25.º
Revogação
1 - O apadrinhamento civil pode ser revogado por iniciativa de qualquer subscritor do compromisso de apadrinhamento, do organismo competente da segurança social ou de instituição por esta habilitada nos termos do n.º 3 do artigo 12.º, da comissão de protecção de crianças e jovens, do Ministério Público ou do tribunal, quando:
a) Houver acordo de todos os intervenientes no compromisso de apadrinhamento;
b) Os padrinhos infrinjam culposa e reiteradamente os deveres assumidos com o apadrinhamento, em prejuízo do superior interesse do afilhado, ou quando, por enfermidade, ausência ou outras razões, não se mostrem em condições de cumprir aqueles deveres;
c) O apadrinhamento civil se tenha tornado contrário aos interesses do afilhado;
d) A criança ou o jovem assuma comportamentos, actividades ou consumos que afectem gravemente a sua saúde, segurança, formação, educação ou desenvolvimento sem que os padrinhos se lhe oponham de modo adequado a remover essa situação;
e) A criança ou jovem assuma de modo persistente comportamentos que afectem gravemente a pessoa ou a vida familiar dos padrinhos, de tal modo que a continuidade da relação de apadrinhamento civil se mostre insustentável;
f) Houver acordo dos padrinhos e do afilhado maior.
2 - A decisão de revogação do apadrinhamento civil cabe à entidade que o constituiu.
3 - Pedida a revogação e havendo oposição de alguma das pessoas que deram o consentimento, a decisão compete ao tribunal, por iniciativa do Ministério Público.
4 - Ao previsto nos n.os 2 e 3 do presente artigo aplicam-se, com as devidas adaptações, os critérios de fixação de competência estabelecidos no artigo 18.º, cabendo a decisão à entidade que, no momento, se mostrar territorialmente competente.
5 - O processo judicial de revogação do apadrinhamento civil é tramitado por via electrónica nos termos gerais das normas de processo civil.
6 - Em qualquer estado da causa e sempre que o entenda conveniente, oficiosamente, com o consentimento dos interessados, ou a requerimento destes, pode o juiz determinar a intervenção de serviços públicos ou privados de mediação.
Artigo 26.º
Direitos dos padrinhos
Quando o apadrinhamento civil for revogado contra a vontade dos padrinhos, e sem culpa deles, as pessoas que tiveram o estatuto de padrinhos mantêm, enquanto o seu exercício não for contrário aos interesses da criança ou do jovem, os seguintes direitos:
a) Saber o local de residência da criança ou do jovem;
b) Dispor de uma forma de contactar a criança ou o jovem;
c) Ser informados sobre o desenvolvimento integral da criança ou do jovem, a sua progressão escolar ou profissional, a ocorrência de factos particularmente relevantes ou de problemas graves, nomeadamente de saúde;
d) Receber com regularidade fotografias ou outro registo de imagem da criança ou do jovem;
e) Visitar a criança ou o jovem, designadamente por ocasião de datas especialmente significativas.
Artigo 27.º
Efeitos da revogação
Os efeitos do apadrinhamento civil cessam no momento em que a decisão de revogação se torna definitiva.
Artigo 28.º
Registo civil
1 - A constituição do apadrinhamento civil e a sua revogação são sujeitas a registo civil obrigatório, efectuado imediata e oficiosamente pelo tribunal que decida pela sua constituição ou revogação.
2 - O registo civil da constituição ou da revogação do apadrinhamento civil é efectuado, sempre que possível, por via electrónica, nos termos do artigo 78.º do Código do Registo Civil.
Artigo 29.º
Alteração ao Código do Registo Civil
Os artigos 1.º, 69.º e 78.º do Código do Registo Civil, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 131/95 , de 6 de Junho, alterado pelos Decretos-Leis n.os 224-A/96, de 26 de Novembro, 36/97, de 31 de Janeiro, 120/98, de 8 de Maio, 375-A/99, de 20 de Setembro, 228/2001, de 20 de Agosto, 273/2001, de 13 de Outubro, 323/2001, de 17 de Dezembro, 113/2002, de 20 de Abril, 194/2003, de 23 de Agosto, e 53/2004, de 18 de Março, pela Lei n.º 29/2007 , de 2 de Agosto, pelo Decreto-Lei n.º 324/2007 , de 28 de Setembro, pela Lei n.º 61/2008 , de 31 de Outubro, e pelos Decretos-Leis n.os 247-B/2008, de 30 de Dezembro, e 100/2009, de 11 de Maio, e pela Lei n.º 29/2009 , de 29 de Junho, passam a ter a seguinte redacção:
«Artigo 1.º
[...]
1 - O registo civil é obrigatório e tem por objecto os seguintes factos:
a) ...
b) ...
c) ...
d) ...
e) ...
f) ...
g) ...
h) ...
i) O apadrinhamento civil e a sua revogação;
j) [Anterior alínea i).]
l) [Anterior alínea j).]
m) [Anterior alínea l).]
n) [Anterior alínea m).]
o) [Anterior alínea n).]
p) [Anterior alínea o).]
q) [Anterior alínea p).]
2 - ...
Artigo 69.º
[...]
1 - Ao assento de nascimento são especialmente averbados:
a) ...
b) ...
c) ...
d) ...
e) ...
f) ...
g) ...
h) A constituição do apadrinhamento civil e a sua revogação;
i) [Anterior alínea h).]
j) [Anterior alínea i).]
l) [Anterior alínea j).]
m) [Anterior alínea l).]
n) [Anterior alínea m).]
o) [Anterior alínea n).]
p) [Anterior alínea o).]
q) [Anterior alínea p).]
2 - ...
3 - ...
Artigo 78.º
[...]
1 - ...
2 - A comunicação prevista no número anterior é enviada no prazo de um dia após o trânsito em julgado da decisão e dela tem de constar a indicação do tribunal, juízo e secção em que correu o processo, a identificação das partes, o objecto da acção e da reconvenção, se a houver, os fundamentos do pedido, a transcrição da parte dispositiva da sentença, a data desta e do trânsito em julgado e, bem assim, os demais elementos necessários ao averbamento.
3 - ...»
Artigo 30.º
Alteração ao Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares
Os artigos 79.º, 82.º e 83.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, abreviadamente designado por Código do IRS, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-A/88 , de 30 de Novembro, passam a ter a seguinte redacção:
«Artigo 79.º
[...]
1 - ...
a) ...
b) ...
c) ...
d) 40 % do valor da retribuição mínima mensal, por cada dependente ou afilhado civil que não seja sujeito passivo deste imposto;
e) ...
2 - ...
3 - ...
4 - ...
Artigo 82.º
[...]
1 - ...
a) ...
b) Aquisição de bens e serviços directamente relacionados com despesas de saúde dos afilhados civis, ascendentes e colaterais até ao 3.º grau do sujeito passivo, que sejam isentas do IVA, ainda que haja renúncia à isenção, ou sujeitas à taxa reduzida de 5 %, desde que não possuam rendimentos superiores ao salário mínimo nacional mais elevado e com aquele vivam em economia comum;
c) ...
d) ...
2 - ...
Artigo 83.º
[...]
1 - São dedutíveis à colecta 30 % das despesas de educação e de formação profissional do sujeito passivo, dos seus dependentes e dos afilhados civis, com o limite de 160 % do valor mensal do salário mínimo nacional mais elevado, independentemente do estado civil do sujeito passivo.
2 - ...
3 - ...
4 - ...
5 - ...»
Artigo 31.º
Alteração à Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais
O n.º 1 do artigo 115.º da Lei n.º 52/2008 , de 28 de Agosto, que aprova a Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, passa a ter a seguinte redacção:
«Artigo 115.º
[...]
1 - Compete igualmente aos juízos de família e menores:
a) ...
b) ...
c) ...
d) ...
e) ...
f) ...
g) Constituir a relação de apadrinhamento civil e decretar a sua revogação;
h) [Anterior alínea g).]
i) [Anterior alínea h).]
j) [Anterior alínea i).]
l) [Anterior alínea j).]
m) [Anterior alínea l).]
n) [Anterior alínea m).]
2 - ...
3 - ...»
Artigo 32.º
Alteração ao Código Civil
Os artigos 1921.º e 1961.º do Código Civil passam a ter a seguinte redacção:
«Artigo 1921.º
[...]
1 - ...
a) ...
b) ...
c) ...
d) ...
2 - ...
3 - O disposto no n.º 1 não é aplicável quando se constituir o apadrinhamento civil.
Artigo 1961.º
[...]
A tutela termina:
a) ...
b) ...
c) ...
d) ...
e) ...
f) ...
g) Pela constituição do apadrinhamento civil.»
Artigo 33.º
Entrada em vigor
1 - A habilitação dos padrinhos, prevista no artigo 12.º, será regulamentada por decreto-lei no prazo de 120 dias.
2 - A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da publicação daquele diploma regulamentador.
3 - Entre a data da publicação e a data de entrada em vigor desta lei, serão desenvolvidas acções de formação tendo como destinatários as entidades a que sejam atribuídas competências nesta lei.
 
Aprovada em 23 de Julho de 2009.
O Presidente da Assembleia da República, Jaime Gama.
Promulgada em 31 de Agosto de 2009.
Publique-se.
O Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva.
Referendada em 31 de Agosto de 2009.
O Primeiro-Ministro, José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.

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